O meu sonho desta noite foi curto. De manhã me levaram para tomar leite ao pé da vaca. Era um leite de espuma, ainda morno, da quentura materna. O meu avô andava vestido num grande e grosso sobretudo de lã, falando com uns, dando ordens a outros. Uma névoa, com fumaça cobria os matos que ficavam nos altos.
Os moleques das minhas brincadeiras da tarde, todos ocupados, uns levando latas de leite, outros metidos com os pastoreadores no curral. Tudo aquilo para mim era uma delícia – o gado, o leite de espuma morna, o frio das cinco horas da manhã, a figura alta e solene de meu avô.
Tio Juca me levou para tomar banho no rio. Com uma toalha no pescoço e um copo grande na mão, chamou-me para o banho.
- Você precisa ficar matuto.
Descemos uma ladeira para o Paraíba, que corria num pequeno fio d’água pelo areal branco e extenso.
- Vamos para o poço das Pedras.
Pouco mais adiante, debaixo de um marizeiro, de copa arrastando no chão, lá estava uma dessas piscinas que o curso e a correnteza do rio cavavam nas suas margens. E foi aí, com meu tio Juca, que bebeu, antes de seu banho um copo cheio de remédio para o sangue, dormindo no sereno, que entrei em relação íntima com o engenho de meu avô. A água frio de poço, naquela hora, deixou-me o corpo tremendo. Meu tio então começou a me sacudir para o fundo, me ensinando a nadar.
Daquele banho ainda hoje guardo uma lembrança à flor da pele. De fato que para mim, que me criara nos banhos de chuvisco, aquela piscina cercada de mata verde, sombreada por uma vegetação ramalhada, só poderia ser uma coisa do outro mundo.
Na volta o tio Juca veio dizendo, rindo-se:
- Agora você já está batizado.
Quando chegamos em casa, o café estava pronto. Na grande sala de jantar estendia-se uma mesa comprida, com muita gente sentada para a refeição. O meu avô ficava do lado direito e a minha tia Marta na cabeceira. Tudo o que era para se comer estava à vista: cuscuz, milho cozido, angu, macaxeira, requeijão. Não era, porém, somente a gente da família que ali se via. Outros homens, de aspecto humilde, ficavam na outra extremidade, comendo calados. Depois seriam eles os meus bons amigos. Eram os oficiais carpinas e pedreiros, que também se serviam com o senhor de engenho, nessa boa e humana camaradagem do repasto.
José Lins do Rego
Muita atenção ao responder as questões!
Obs: Cada questão relacionada ao texto vale 1 ponto.
1) Por que o sonho do menino foi curto naquela noite?
2) Quais as principais mudanças ocorridas na vida do menino? Ele gostava ou não da novidade?
3) Por que os garotos da mesma idade não brincavam com o recém-chegado pela manhã?
4) Você concorda com esta afirmação: “De manhã” retrata a infância de um garoto e foi escrito quando ele já era adulto? Comprove sua resposta transcrevendo em seu caderno trechos do texto.
5) Comente a atitude dos homens que faziam a refeição juntamente com os parentes do garoto. O narrador será, posteriormente, amigos desses homens. O que isso nos revela sobre ele?
6) Para o menino, sair da cidade e viver no campo significou uma vida melhor ou pior? Justifique sua resposta.
7) O garoto após já estar acostumado com a vida no engenho, resolve dar uma volta pelos campos. Para não preocupar o avô, ele deixa um bilhete. Só que ele se confundiu um pouco em sua redação. Você deve ler com atenção o bilhete e reescrevê-lo, aproximando a redação da norma culta. (4 pontos)
Querido vô
Tô saindo pra dar umas volta pra conhecer melhor as redondezas. O senhor não te preocupe porque eu tô indo em companhia do José. Peguei a sua espora, mas não vou estragar ela. A gente não vamos demorar. Sabe aquele chapéu que eu te dei? Peguei ele para mim proteger um pouco do sol. Esta sela que está lá no paiol vou usar também. Me desculpe pela pressa.
Peço-te sua bênção.
Do seu neto João.
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Atividade enviada por Susana Felix para Professores Solidários.
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